Cannabis e fotossíntese
Provavelmente recorda-se do termo “fotossíntese” das aulas de biologia. No entanto, a maioria das pessoas acaba por esquecer o que este processo envolve — até que começa a cultivar canábis! Neste artigo vamos explorar o que é a fotossíntese, de que forma a qualidade da luz pode influenciar este processo e como isso pode impactar a produção de canabinóides.
Para crescerem saudáveis, as plantas de cannabis dependem de vários elementos externos. Necessitam de nutrientes para formar proteínas, construir as suas paredes celulares e realizar importantes processos bioquímicos. PrecISam ainda de água para dissolver e transportar estes nutrientes por toda a planta. Todos estes factores têm um papel fundamental no vigor e desenvolvimento das plantas. No entanto, o principal motor do crescimento não se encontra nem em embalagens nem em adubos compostos — vem directamente do sol (ou de potentes lâmpadas de cultivo). Vamos então explorar de forma mais profunda este processo vital.
O que é a fotossíntese?
O próprio termo “fotossíntese” revela o seu significado: "foto" remete à luz, enquanto "síntese" diz respeito à formação de compostos orgânicos. Na prática, trata-se do processo através do qual as plantas transformam a luz em energia química essencial à sua sobrevivência. Mas, como se dá exatamente este fenómeno? As plantas contam com um sofisticado conjunto de mecanismos biológicos que tornam isto possível. Para percebermos realmente como funciona, precisamos de olhar para o nível celular.
A fotossíntese decorre sobretudo nas folhas, mais concretamente em células especializadas chamadas de células do mesofilo. Estas formam uma camada logo abaixo da superfície da folha e são responsáveis por captar a luz. No seu interior existem organelos chamados cloroplastos, ricos em clorofila — o pigmento que confere o tom esverdeado às plantas e que é fundamental por conseguir absorver luz. A clorofila encontra-se disposta em estruturas semelhantes a pilares, denominadas tilacoides, sendo o espaço entre elas chamado de estroma.
O processo de fotossíntese divide-se em duas etapas fundamentais: as reações dependentes da luz e as independentes da luz. Para começar, o dióxido de carbono (CO₂) e a água (H₂O) entram na folha. O CO₂ entra através dos estomas (pequenas aberturas na superfície da folha), enquanto a água é puxada pelas raízes através dos vasos xilémicos.
De seguida, fotões provenientes do sol (ou das tuas lâmpadas de cultivo) atingem as moléculas de clorofila. A energia faz com que os eletrões da clorofila "saltem" para um estado mais energético. Ocorre então uma série de reações dependentes da luz que permitem armazenar energia sob a forma de ATP (a moeda energética das células) e NADPH (um transportador de eletrões). Todas estas transformações acontecem nas membranas dos tilacoides.
Estes compostos energéticos alimentam depois o chamado ciclo de Calvin (também conhecido por reações independentes da luz), que tem lugar no estroma. Aqui, são utilizados para “fixar” o carbono, formando moléculas de açúcar com três átomos de carbono. Estas unidades juntam-se para dar origem à glucose, a fonte energética básica que as plantas utilizam, quer para obter energia, quer para formar outros hidratos de carbono estruturais.
Qualidade da luz: watt, lúmen, PAR e PPFD
Já explicámos porque as plantas precisam de luz para realizar a fotossíntese, mas será que todos os tipos de luz são igualmente eficazes? Não. Em muitos locais do mundo, a luz solar natural fornece energia suficiente para a fotossíntese. No entanto, quem cultiva em ambientes fechados precisa de investir num sistema de iluminação capaz de gerar energia bastante para que as plantas prosperem.
Existem vários tipos de luzes para cultivo interior, como LED, HID e fluorescentes. Cada uma tem vantagens e desvantagens, mas o mais importante é a qualidade da luz que produzem.
Potência
Deve prestar atenção à potência – a quantidade de energia elétrica consumida – ao escolher as lâmpadas para as suas plantas. Caso a potência seja insuficiente, a luz produzida não será adequada para o crescimento saudável das plantas. Para uma colheita doméstica satisfatória, recomenda-se utilizar lâmpadas que forneçam entre 400 e 600W por metro quadrado. Para quem pretende maximizar a produção de flores, lâmpadas acima de 1000W por metro quadrado são ideais.
Lúmen
Os produtores podem avaliar a qualidade da luz recorrendo a várias medições. Antes de mais, um luxímetro permite analisar a quantidade de luz que determinada zona de um espaço de cultivo está a receber. O lux mede a intensidade luminosa (lúmens) emitida por um dispositivo, distribuída por uma área específica. Os luxímetros medem a luz visível ao olho humano, pelo que não fornecem uma indicação exata da luz efetivamente disponível para as plantas. No entanto, são suficientes para dar aos cultivadores domésticos uma ideia geral da luminosidade recebida pela cultura. Recomenda-se proporcionar cerca de 40.000 lux durante a fase vegetativa e 60.000 lux na fase de floração.
PAR e PPFD
O lux pode parecer útil, mas e se quiser saber exatamente qual a potência de crescimento de uma determinada lâmpada? Aqui entra em cena o PAR (radiação fotossinteticamente ativa). O PAR corresponde à luz no espectro dos 400 aos 700 nm, que as plantas utilizam para realizar a fotossíntese. A unidade de medida do PAR — micromoles por segundo (μmol/s) — indica quantos fotões dentro deste espectro atingem as folhas da planta a cada segundo. Este valor é conhecido como PPFD (densidade de fluxo de fotões fotossintéticos).
Para medir o PAR, utiliza-se um medidor de PAR, equipado com sensores que detetam luz entre os 400 e os 700 nm. Para obter um valor médio de PPFD, deve medir-se em várias zonas do topo das plantas, sempre à mesma altura. Durante a fase vegetativa, procure alcançar cerca de 350 μmol/s, e aproximadamente 850 μmol/s na fase de floração.
Os fabricantes de iluminação agrícola devem fornecer estes dados. Para garantir a precisão dos valores de PPFD, certifique-se de que a marca apresenta a distância entre o topo da planta e a fonte de luz, várias leituras, uma média e a relação min:max.
Condições ideais para a fotossíntese
A intensidade da luz não é o único fator que pode potenciar a fotossíntese. Estudos mostram que a temperatura e o dióxido de carbono também contribuem para otimizar este processo.
A fotossíntese depende de várias enzimas para transformar energia. Estas proteínas não funcionam bem com temperaturas baixas (0–10°C), diminuindo assim a taxa fotossintética e atrasando o crescimento da planta. Por outro lado, temperaturas demasiado elevadas (acima de 20°C) também afetam negativamente estas enzimas essenciais. O intervalo ideal de temperatura para o seu desempenho situa-se entre os 10°C e os 20°C.
Curiosamente, o CO₂ permite que as plantas de canábis prosperem em ambientes um pouco mais quentes. Níveis elevados deste gás, aliados a luz intensa, favorecem ainda mais a fotossíntese. Quanto mais luz chega às folhas, maior é a necessidade de carbono para transformar essa energia em açúcares. Se utiliza luzes de 600W num espaço pequeno, poderá compensar aumentar os níveis de CO₂. Muitos cultivadores recorrem a botijas para alcançar concentrações ideais entre 1.500 e 2.000 ppm; no entanto, uma solução simples consiste em utilizar comprimidos dissolúveis no solo.
Como a taxa de fotossíntese pode afetar o teor de canabinóides
Parece lógico assumir que uma maior taxa de fotossíntese permite à planta gerar mais energia e, consequentemente, aumentar a produção de canabinoides. Contudo, ainda existem poucas investigações sobre este tema, sendo evidente que o processo é bastante complexo. Por exemplo, um estudo demonstrou que alguns ecótipos de cannabis registaram uma taxa fotossintética superior em ambientes mais quentes, mas desenvolveram um maior teor de canabinoides quando cultivados a temperaturas mais baixas. É necessário realizar mais estudos para esclarecer estes mecanismos.
Sabe-se também que diferentes tipos de luz, mesmo com a mesma intensidade, provocam variações no perfil de canabinoides produzido pelas plantas. A investigação indica que luzes HPS (sódio de alta pressão) resultam num maior peso seco de flores, enquanto as luzes LED tendem a potenciar níveis superiores de CBG, THC e CBD.
Existe diferença entre variedades fotoperiódicas e autoflorescentes no que toca à fotossíntese?
As variedades fotoperiódicas e autoflorescentes reagem de forma distinta à luz. Apesar de ambos os tipos realizarem a fotossíntese da mesma maneira, as variedades fotoperiódicas necessitam de uma alteração no ciclo de luz para iniciar a floração. Normalmente, os cultivadores mantêm estas plantas sob 18 horas de luz e 6 horas de escuridão na fase vegetativa. Mais tarde, passam para um ciclo de 12 horas de luz e 12 horas de escuridão para desencadear a floração. Se receberem mais luz do que este período, permanecem indefinidamente em crescimento vegetativo.
Por outro lado, as variedades autoflorescentes florescem independentemente do ciclo de luz. Podem suportar 24 horas de luz contínuas durante toda a vida e ainda assim desenvolver flores. Isto significa que, nas autoflorescentes, há maior possibilidade de realizar fotossíntese durante a floração. No entanto, é importante que também tenham algum tempo de escuridão para respirarem. O horário mais indicado para estas plantas em cultivo interior é de 20 horas de luz e 4 horas de escuridão ao longo de todo o ciclo de vida.