A canábis pode ajudar na perda de peso?

Quando se fala no consumo de canábis e a sua relação com a alimentação, é comum lembrar de imediato o tão conhecido "munchies" — aquela vontade súbita e intensa de comer que surge após consumir marijuana. Este efeito é amplamente reconhecido, e, de facto, está relacionado com a forma como a canábis pode ativar certos mecanismos no organismo, aumentando o apetite. Além disso, a canábis medicinal é frequentemente utilizada para estimular o apetite em doentes que precisam de ganhar peso, como em casos de anorexia ou tratamentos agressivos como a quimioterapia.

No entanto, apesar deste aumento do apetite, diversos estudos sugerem que os consumidores regulares de canábis têm, na verdade, menor tendência para o excesso de peso. Afinal, será que a canábis pode ter algum papel na perda de peso? Vamos analisar de que forma esta planta poderá contribuir para controlar o peso.

Deve fumar para perder peso?

De acordo com um inquérito realizado em 2011 (Le Strat & Le Foll), as taxas de obesidade eram mais elevadas entre as pessoas que não consumiam canábis, ao contrário do que acontecia nos consumidores. Mas então, acender um charro é o segredo para perder peso? Não é bem assim. Sabemos que o processo de perda de peso envolve muitos fatores, e alguns estudos sugerem que a canábis pode influenciar certas áreas de forma relevante.

A canábis, graças ao seu potencial relaxante, pode ajudar a aliviar dores ou limitações físicas, facilitando a prática de exercício físico. Além disso, muitos utilizadores de canábis acabam por evitar bebidas alcoólicas, o que se traduz numa ingestão calórica inferior. A qualidade do sono também desempenha um papel importante no controlo de peso; como o consumo de canábis está frequentemente associado à sensação de relaxamento, pode proporcionar noites de sono mais tranquilas, essenciais para evitar o aumento de peso.

E quanto à larica?

Se já viste filmes como “Harold & Kumar vão ao White Castle”, provavelmente já te apercebeste de que fumar uma quantidade significativa de cannabis pode levar a uma vontade irresistível de comer quase tudo o que está à mão.

Apesar de nestes filmes o apetite voraz ser exagerado, a verdade é que não é assim tão irreal. Mas afinal, porque surgem estes desejos súbitos?

A ciência aponta para o papel do bolbo olfactivo, uma área do cérebro responsável pelo processamento do olfacto (Stromberg, 2014). Em experiências feitas com ratos de laboratório, foi analisado o efeito do THC na intensificação das sensações de sabor e cheiro durante as refeições.

Em suma, o estudo indica que, se o consumo de cannabis potencia as sensações ligadas à comida, pode também aumentar o apetite. Ou seja, se a comida parecer mais saborosa ou cheirar melhor, vais sentir mais vontade de comer.

Compreender a ligação entre a cannabis e a perda de peso

O emagrecimento envolve vários fatores. Porém, de forma simples, tudo se resume a isto: quando existe um défice calórico, perde-se peso.

O corpo queima calorias durante todo o dia, mesmo quando realiza apenas funções básicas como respirar, dormir ou bombear sangue. Este processo é conhecido como taxa metabólica basal (TMB).

Cria-se um défice calórico ao reduzir a ingestão alimentar e aumentar a actividade física. Assim que isto acontece, o organismo recorre às reservas de gordura para obter energia. Mas qual é o papel da canábis neste processo? Eis algumas possibilidades.

A canábis e o sistema digestivo

Uma teoria sugere que o consumo de cannabis pode ajudar na perda de peso devido ao seu efeito no sistema digestivo. Um ensaio clínico (Thu et al., 2023), que contou com a participação de 2.526 pessoas, analisou a possível influência da cannabis na microbiota do corpo humano — um conjunto de microrganismos fundamentais tanto para a estimulação do sistema imunitário como para a decomposição de substâncias potencialmente tóxicas dos alimentos. A microbiota é essencial para o bom funcionamento intestinal. Os dados deste estudo apontam para uma relação entre o uso de cannabis e alterações na microbiota em várias partes do organismo. Ainda assim, são necessários mais estudos para se tirarem conclusões definitivas.

Cannabis e mobilidade

Quando sente desconforto físico, a sua mobilidade acaba por ser afectada. Esta limitação impede-o de realizar tarefas produtivas, incluindo praticar exercício. Como sabemos, o exercício é um dos elementos essenciais para perder peso e manter um estilo de vida saudável.

No entanto, estudos mais recentes têm procurado avaliar se a canábis poderá oferecer alívio para o incómodo provocado por dores, depressão ou problemas de sono. Em particular, o THC tem sido alvo de muita investigação nesta área.

No que diz respeito à investigação aprofundada, destaca-se uma revisão sistemática de 2015 (Whiting et al.), que analisou 79 ensaios clínicos centrados no uso médico de canabinóides. Os autores concluíram que existe "evidência de qualidade moderada" a suportar a utilização de canabinóides no tratamento da dor crónica e da espasticidade. Mencionam ainda que existe "evidência de fraca qualidade" que sugere associações entre canabinóides e melhorias em náuseas e vómitos provocados por quimioterapia, perturbações do sono, síndrome de Tourette e aumento de peso relacionado com o VIH.

Canábis e humor

Para muitos, o termo “afetividade negativa” pode ser desconhecido. Em termos simples, trata-se de uma característica de personalidade que leva a pessoa a sentir emoções negativas e ter uma baixa autoestima. Esta tendência está fortemente ligada ao desenvolvimento de problemas de saúde mental, que podem, por sua vez, conduzir a estilos de vida menos saudáveis.

No entanto, é interessante saber que o uso do canábis está a ser estudado pelo seu potencial para aliviar estas condições. Um estudo recente (Alshaarawy & Anthony, 2019) focado em utilizadores de marijuana medicinal salienta exatamente isso.

Ainda que os estudos clínicos não sejam totalmente conclusivos, pode sempre tentar perceber por si se existe uma ligação entre o consumo de canábis e a redução da afetividade negativa, promovendo um estilo de vida mais ativo.

Canábis e o sono

É inegável que o sono desempenha um papel fundamental no nosso bem-estar. Durante o descanso, o organismo dedica-se a reparar danos, consolidar memórias e optimizar diversas funções essenciais.

A privação de sono, por sua vez, traz mais prejuízos do que benefícios. Relativamente ao controlo de peso, vários estudos (Gozal et al., 2016) identificaram uma relação directa entre a falta de descanso adequado e o aumento de peso. As investigações apontam que quem dorme pouco tende a consumir mais calorias, sobretudo quando tem fácil acesso a alimentos.

Se sofre de dificuldades em adormecer ou manter o sono, a cannabis pode ser uma aliada. Muitos recorrem a variedades ricas em Kush para relaxar e beneficiar das acentuadas propriedades indutoras de sono desta planta. Segundo uma revisão de 2017 (Babson et al.), os investigadores partilham da mesma opinião, destacando o THC como principal responsável por este efeito. Ainda assim, outros canabinóides também apresentam potencial, como é o caso do CBD, um componente bastante popular que promove relaxamento sem efeitos psicoactivos.

Cannabis e metabolismo

Referimo-nos anteriormente a alguns estudos que sugerem que os consumidores regulares de cannabis tendem, em geral, a apresentar um índice de massa corporal mais baixo. Nesta secção, vamos explorar as possíveis razões para este fenómeno.

De acordo com um estudo realizado em 2018 (Rossi et al.), uma das teorias sugere que doses elevadas de cannabis podem exercer um efeito marcadamente promotor do sono, o que pode contribuir para uma diminuição do apetite.

Outro estudo (Le Strat & Le Foll, 2011) avança que, desde que a legalização do uso recreativo da cannabis tem ganho espaço, observou-se uma redução dos episódios de consumo excessivo de álcool. Como é do conhecimento geral, as bebidas alcoólicas podem ser bastante calóricas. Assim, substituir o consumo de álcool por cannabis pode contribuir para um maior controlo do peso.

No que diz respeito ao impacto da cannabis no metabolismo, os investigadores do estudo de 2018 anteriormente mencionado identificaram uma relação entre a dieta, a produção de endocanabinóides e o aumento de peso. Mais concretamente, as pessoas cuja alimentação apresenta um elevado teor de ácidos gordos ómega-6/ómega-3 evidenciam níveis superiores de anandamida e 2-araquidonoilglicerol (2-AG) no organismo, o que as pode tornar mais propensas a disfunções metabólicas.

No entanto, de acordo com os mesmos investigadores, o consumo de cannabis poderá contribuir para reduzir tanto os níveis de anandamida como de 2-AG, promovendo assim o equilíbrio do metabolismo.

A cannabis pode provocar aumento de peso?

A canábis pode provocar aumento de peso? Mais uma vez, a resposta não é simples. Embora o consumo de variedades ricas em THC traga possíveis benefícios, é importante reconhecer que este cannabinoide pode estimular o apetite. Em doses baixas, este efeito tende a ser pouco significativo, mas em doses mais elevadas poderá resultar num aumento da ingestão calórica em alguns utilizadores. No entanto, isto não deve ser encarado automaticamente como algo negativo.

De facto, um estudo (Sansone & Sansone, 2014) indica que a canábis tem sido utilizada há muito tempo para fins medicinais, sobretudo em doentes com VIH/SIDA e cancro, para ajudar a estimular o apetite.

Que tipo de canábis é mais indicada para perder peso?

Quando se fala em cannabis, o pensamento vai imediatamente para as variedades ricas em THC, conhecidas pelo efeito psicoativo. Mas será que estas são as mais indicadas para quem procura perder peso? Descubra outros canabinóides que podem ter um papel ainda mais relevante neste objetivo.

THCV para emagrecimento

Alguns de vocês podem ter ficado surpreendidos ao ler este título, mas não, não se trata de um erro. THCV é também um canabinóide. Apesar de não ser tão conhecido como o THC, estudos referem que provavelmente também possui efeitos psicotrópicos, mas apenas quando consumido em doses bastante superiores às do THC. Ambos os compostos têm estruturas moleculares muito semelhantes, mas falta uma pequena parte ao THCV, o que altera significativamente o seu efeito nos seres humanos.

No que diz respeito à perda de peso, investigações (Whiting et al., 2015) têm analisado o potencial do THCV para reduzir o apetite. Os cientistas estão atualmente a estudar a sua capacidade de inibir os recetores CB1 como possível mecanismo de ação.

Se gostaria de experimentar este canabinóide, já existem variedades disponíveis no mercado ricas em THCV, como é o caso da THC-Victory, entre outras.

CBD na perda de peso

Como se posiciona o CBD no universo da canábis e da perda de peso? Embora as investigações mais aprofundadas ainda sejam escassas e seja necessário um maior volume de estudos para obter provas concretas, já existem investigações preliminares que analisam o potencial do CBD em ajudar no controlo do apetite, através da redução da ingestão alimentar.

Outros estudos procuram perceber se o CBD contribui para a decomposição da gordura e até para a diminuição do risco de disfunções metabólicas. No entanto, esta área de investigação encontra-se ainda numa fase inicial e há muito por descobrir sobre o verdadeiro papel do CBD na perda de peso.

Canábis e perda de peso: Resultados concretos ou apenas mito?

Como já explicámos, perder peso de forma saudável envolve vários fatores. No entanto, estudos recentes indicam que a canábis pode desempenhar um papel positivo quando associada a métodos comprovados de controlo de peso, como uma alimentação equilibrada e atividade física regular.

Naturalmente, ao considerar o uso de canábis, é importante escolher formas de consumo que não favoreçam o aumento de peso. Por exemplo, alimentos ricos em açúcar ou sal não são a melhor escolha para criar um défice calórico. Além disso, embora fumar ou vaporizar variedades ricas em THC possa aumentar a vontade de comer, é possível optar por variedades com predominância de CBD e THCV para tentar reduzir esses desejos.

Independentemente da eficácia da canábis no emagrecimento, a fórmula comprovada passa sempre por criar um défice calórico: isto é, manter uma alimentação adequada, na quantidade certa, aliada ao exercício físico, descanso de qualidade e bem-estar emocional.

Adam Parsons

Adam Parsons é jornalista profissional especializado em canábis, copywriter e autor, integrando há vários anos a equipa da Zamnesia. Responsável por abordar uma vasta gama de temas, desde o CBD aos psicadélicos, entre outros, Adam dedica-se à criação de artigos de blog, guias e à exploração contínua de uma oferta de produtos cada vez mais diversificada.

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