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10 razões para legalizar todas as drogas
7 min

10 razões para legalizar todas as drogas

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Independentemente da sua opinião sobre a legalização das drogas, há lições importantes a retirar deste debate. Eis alguns argumentos relevantes a favor desta questão.

Percorremos um longo caminho desde o início da chamada "Guerra contra as Drogas". Hoje, sabemos que grande parte do que nos foi transmitido naquela altura sobre as drogas era falso — simples alarmismo alimentado por interesses em manter a proibição. Graças à ciência, começámos a desfazer esta rede complexa de desinformação. Por isso mesmo, assiste-se atualmente a uma reforma profunda das políticas sobre drogas em diversos países, incluindo a legalização do canábis em alguns. A própria ONU prepara-se para rever a sua legislação ultrapassada sobre drogas e os cientistas desafiam em todo o mundo preconceitos sobre dependência, riscos e a forma como a sociedade lida com os consumidores.

Uma das soluções apontadas para os danos provocados pela Guerra contra as Drogas — embora polémica para alguns — passa pela legalização de todas as substâncias, sim, de todas sem exceção.

Antes de descartares completamente a ideia, vale a pena refletir sobre os pontos seguintes e considerar outras perspetivas. Existem argumentos bem fundamentados, com apoios de peso, a favor desta proposta. Mesmo que não concordes, os 10 pontos abaixo servem para alimentares o debate sobre a legalização e aprofundares o teu conhecimento sobre este tema.

10. Poupança de milhares de milhões de euros

Estima-se que o custo global para manter a chamada Guerra contra as Drogas – que tem mostrado ser ineficaz – ronda os 100 mil milhões de dólares por ano. Trata-se de um valor exorbitante, que poderia ter um impacto muito mais positivo se fosse canalizado para setores como a educação ou a saúde. Basta olhar para o exemplo de Portugal, onde todas as drogas foram descriminalizadas. O dinheiro antes investido na repressão foi direcionado para a prevenção, tratamento e reintegração social dos consumidores. O resultado? Drástica redução do consumo, das mortes ligadas à droga, da criminalidade e de quase todos os problemas normalmente associados ao fenómeno. O sucesso foi tal que hoje praticamente não há vozes na sociedade a querer voltar atrás. Legalizar todas as drogas seria o golpe final na Guerra contra as Drogas, impedindo o desperdício de milhares de milhões.

9. A GRANDE MAIORIA DOS RECURSOS POLICIAIS SERIA LIBERTADA

Poupar dinheiro leva-nos ao próximo ponto. Com a legalização, grande parte do orçamento e do tempo da polícia poderia ser direccionada para o combate ao crime grave – algo que tanto agentes como cidadãos desejam. Actualmente, as forças de segurança em todo o mundo gastam grande parte dos seus recursos na perseguição de consumidores de drogas e pequenos traficantes. Se as drogas fossem legais, este problema deixaria de existir.

8. Os sistemas judiciais tornar-se-iam muito mais eficientes

Outro aspeto a considerar é que o elevado número de detenções por consumo de drogas está a sobrecarregar o sistema judicial em vários países, resultando em atrasos e custos elevados. Com esta mudança, essa situação deixaria de acontecer.

7. O mercado negro seria enfraquecido

Já imaginou como seria o mercado negro num mundo onde as drogas pudessem ser compradas e consumidas de forma legal e segura? A verdade é que perderia grande parte do seu poder. Claro que continuaria a existir – enquanto houver algo ilegal para vender, haverá sempre quem o queira fazer. Mas as drogas já não fariam parte do seu negócio principal.

Os resultados disto já se começam a sentir nos Estados Unidos. Apesar de só alguns estados terem legalizado o consumo recreativo de canábis, os cartéis mexicanos – que eram os principais fornecedores de marijuana ilegal no país – sofreram grandes quebras nos seus lucros*.

*Fonte: Marijuana Legalization: What Everyone Needs to Know de J. Caulkins, A. Hawkins, B. Kilmer e M. Kleiman.

6. As drogas tornam-se muito mais seguras

Talvez o maior perigo associado ao consumo de drogas ilícitas seja precisamente não saber o que se está a consumir. Estas substâncias podem estar misturadas com qualquer tipo de adulterante, causando danos imprevisíveis à saúde. Basta olhar para o caso do ecstasy, frequentemente misturado com pó de tijolo, anfetaminas, veneno para ratos, giz e outros agentes – tudo para aumentar o lucro dos traficantes. Se houvesse pontos de venda regulados, seriam impostas exigências rigorosas de pureza e garantida a educação dos consumidores sobre o seu uso.

Existe quem defenda que a regulação poderia aumentar os casos de dependência e overdose. No entanto, a perceção tradicional da dependência tem vindo a ser questionada por especialistas, que sugerem que o contexto de vida pode ser mais determinante do que a substância em si. A informação adequada poderia, assim, ter um papel essencial na redução destes riscos. Portugal é frequentemente apontado como um exemplo neste debate. Apesar de drogas como a heroína não serem legais, o seu consumo e posse foram descriminalizados. O resultado não foi um aumento, mas sim uma diminuição das dependências e overdoses. Através de iniciativas de educação e apoio, os números caíram quase 50%. Isto demonstra que, retirando o peso da criminalização, não se agravam os problemas de dependência e mortalidade, mas antes diminuem.

5. Evita o declínio das liberdades civis

Trata-se aqui de uma questão mais filosófica e conceptual: com que legitimidade é que o Estado nos pode impor restrições sobre o que decidimos consumir? É evidente que, caso uma substância coloque em risco a segurança do próprio, da sociedade ou da família, haja justificativa para a sua regulação. Porém, se o consumo de drogas ocorre de forma responsável, sem causar danos a terceiros, será legítimo proibi-lo? Muitos exemplos mostram que é possível consumir diversas substâncias, sejam legais ou ilegais, sem colocar ninguém em perigo — desde médicos a funcionários da limpeza, há quem faça uso de cocaína e até heroína e consiga manter uma vida perfeitamente funcional. Então, por que razão estas substâncias permanecem ilegais quando outras, como o álcool e o tabaco, são permitidas?

Um caso paradigmático foi o da guerra do Vietname. Mais de 20% dos soldados norte-americanos destacados recorreram frequentemente à heroína; ainda assim, quando regressaram ao seu país, 95% conseguiram reintegrar-se sem sinais de dependência ou necessidade de tratamento. Isto prova que a adição é um fenómeno muito mais complexo do que se pensa — e que a simples utilização não conduz, inevitavelmente, à dependência. Não deveremos, por isso, cair em pressupostos simplistas que limitem a liberdade e a escolha individuais.

4. Contribuiria para a estabilidade dos países afectados pela guerra contra as drogas

México, o Médio Oriente e a América do Sul são algumas das regiões mais afetadas pela Guerra contra as Drogas, liderada pelos EUA. Nestes locais, é produzida grande parte das drogas ilícitas consumidas no Ocidente, criando um clima de corrupção, violência e morte. Senhores da guerra financiam rebeliões através do tráfico, enquanto cartéis lucram com o sofrimento de populações inteiras. Ao reduzir a procura por estas substâncias, enfraquece-se o poder de quem as produz, permitindo maior estabilidade e uma melhoria significativa nas condições de vida das comunidades locais.

Recorrendo novamente ao exemplo dos cartéis mexicanos, a legalização da canábis nos EUA já está a contribuir para a diminuição dos homicídios ligados a gangues no país — os índices de homicídio atingiram mínimos históricos nos últimos anos.

3. Contribuiria para combater a discriminação étnica

É amplamente reconhecido que as minorias étnicas são mais frequentemente alvo de paragens e revistas por parte das autoridades policiais; também a população prisional detida por crimes relacionados com drogas é desproporcionalmente composta por indivíduos de minorias étnicas. No Reino Unido, um relatório recente revelou que, embora pessoas brancas consumam praticamente o dobro de drogas em relação a pessoas negras, estas são seis vezes mais suscetíveis de serem intercetadas e revistadas. Esta tendência verifica-se um pouco por todo o mundo. Acabar com a criminalização das drogas pode travar esta injustiça e ajudar a combater o racismo estrutural que permanece enraizado nas nossas sociedades.

2. A proibição não resulta

Se há algo que a investigação, os dados e a experiência no terreno nos têm mostrado, é que o modelo atual de proibição não funciona. Em vez de proteger as pessoas, acaba por criminalizar cidadãos comuns pelo consumo de drogas.

A teoria é que o receio de prisão deveria demover os indivíduos do consumo, mas a realidade é bem distinta: cada vez mais pessoas consomem substâncias classificadas como ilegais pelas autoridades. Em vez de proteger quem consome dos riscos e da exclusão social, o modelo vigente leva à reclusão e registo criminal dos que são apanhados, dificultando muito a possibilidade de estas pessoas voltarem a encontrar emprego digno ou de se reintegrarem nas suas comunidades. Assim, instala-se um ciclo descendente que causa mais danos à sociedade do que benefícios.

Continuamos a investir milhares de milhões de euros num sistema que teima em falhar repetidamente e que permanece tão inflexível quanto quando foi criado.

1. Vai salvar milhares de vidas

A proibição das drogas resulta, na realidade, em mais mortes do que aquelas que evita. Não esqueçamos que os medicamentos sujeitos a receita matam mais pessoas do que as drogas ilegais. Um mercado legal e regulado protege os consumidores ao garantir a qualidade das substâncias, aumentando o acesso a informação e reduzindo os riscos de morte e dependência. Ao legalizar, elimina-se também a violência associada ao tráfico, corta-se uma fonte de financiamento às redes criminosas e evitam-se milhares de homicídios e casos de corrupção, que hoje continuam a ceifar vidas. A legalização permitiria ainda mais investigação sobre potenciais usos terapêuticos, dando opções adicionais a quem mais precisa. Não será isto já motivo suficiente? O potencial para salvar vidas é extraordinário – e, no final do dia, é isso que realmente importa.

Não somos ingénuos ao ponto de pensar que legalizar todas as drogas seria simples ou isento de desafios. Também não acreditamos que tal transformação vá acontecer em breve, ou até se acontecerá alguma vez. Ainda assim, conhecer e discutir os factos que defendem a legalização pode tornar o debate público mais informado e construtivo. Se esse debate levar a pequenas melhorias – seja numa política nacional, seja na forma como alguém vê ou trata quem consome drogas – já terá valido a pena.

Steven Voser
Steven Voser
Steven Voser é um jornalista independente especializado em canábis, com mais de seis anos de experiência a escrever sobre todos os aspetos da planta: desde os métodos de cultivo, às melhores formas de consumo, passando ainda pelo dinâmico setor e pelo complexo enquadramento legal que o envolve.
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